quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

ANNA & OTTO

Meu nome é Anna Bonfim. Sou, e sempre fui - desde pequena - uma estudiosa, pessoa das artes, sempre preferi os livros, o teatro, o cinema, a música. Durante a vida toda tive saúde no limiar. Sempre saudável, porém muitos cuidados eram requeridos.

Ele, Otto Faustino, sempre preferiu outras coisas - no meu ponto de vista, erradas. Nunca se fixou a nada, nem a ninguém e nem a lugar nenhum; nunca teve nenhum cuidado, uma pessoa entregue a tudo que pudesse fazer mal - de um simples bacon às piores drogas. Às piores atitudes.

O meu problema com ele, tirando minha opinião sobre pessoas que matam pessoas, vem do fato de sermos a mesma pessoa, ou sermos a mesma coisa.

Não pensem que o que se segue é mais uma história de Jeckyl e Hide - apesar de a comparação ser pertinente. O caso que aqui apresento é semelhante, porém de muito maior gravidade, e isso eu lhes garanto.

No caso da famosa história, o médico criou uma poção que transformava seu corpo, índole e maneira de ver o mundo. Com o tempo, a poção deixou de ser necessária e o lado monstro aparecia quando queria. Algo parecido com o Hulk e mais uma dúzia de personagens. O bom, se é que se pode dizer assim, é que as personalidades escondidas existiam em momentos diferentes, como um Super Homem e Clark Kent ao avesso.

Logo, era fácil acabar com o mal (se o lado ‘monstro’ não fosse do agrado da personalidade principal): eliminando um dos dois, ambos desapareceriam. Os fatos relatados nas histórias eram como um castigo ou um prêmio, como uma moral a ser aprendida. “Nunca tente ser o que você não é”, ou coisa que o valha. No meu caso a coisa complica.

Nós somos a mesma pessoa e vivemos ao mesmo tempo. Não há divisória entre Anna e Otto. Bem, na verdade há uma diferença: ele só é eu quando durmo, e eu sou ele quando ele dorme. O problema é que não habitamos a mesma realidade. Somos contemporâneos, mas vivemos em realidades paralelas. Não fizemos nada para que isso acontecesse. Simplesmente ocorreu. É fácil de entender quando acontece com você. Vamos explicar detalhadamente.

Até cinco anos atrás o mundo era um e todos os fatos ocorriam normalmente, como acontecem para todos nós. Por essa data, quando ia dormir, ao invés de dormir, acordava Otto Faustino. Ou seja, era como se ele tivesse sonhado que era eu.

Toda vez que ele sonha que sou eu, na verdade sou eu mesma. E toda vez que eu sonho ser ele, sou ele mesmo.

Bom, então fica fácil saber onde está o problema - é só eu ir a um médico da cabeça, me internar, e tudo resolvido. Ledo engano, típico de quem - graças a Deus e obviamente - não vive o que vivo.

Nem por um segundo isso me passou pela cabeça, pois quando ele acorda, tenho certeza de que Anna Bonfim é um sonho idiota.

A realidade para ele é a seguinte: até cinco anos atrás o mundo era um e todos os fatos ocorriam normalmente, como acontecem para todos nós. Por essa data, quando ia dormir, ao invés de dormir, acordava Anna Bonfim. Entenderam o drama?

O meu mundo, de cinco anos pra cá, é totalmente diferente do mundo dele. Mas qual é o real?

Impossível dizer, pois dependendo da pessoa que sou, esse é o mundo real, e tanto eu quanto ele não estamos dispostos a abrir mão da própria realidade, e nem que tivéssemos essa intenção, nunca - assim como qualquer ser humano - conseguiríamos. Como se muda um mundo inteiro? Como se apaga um passado, sendo que ele não é um passado - é a realidade dura que a cada milésimo de existência vem cobrar de você?

Já tentei ficar acordada, mas minha saúde, que como já disse antes, estava no limite, começou a despencar, e a cada dia que passa penso o quanto mais vou agüentar. No início pensei que o faria mudar, mas não... Com o tempo, piorou.

Ele não tem interesse em ser uma boa pessoa, pois nem sabe que é uma má pessoa. O que mudou foi que começou a dormir um pouquinho mais, mas quando comecei a me cansar e a ficar fraca, voltou ao normal.

Já pensamos ambos em cometer suicídio. Mas dizem que o sono é parecido com a morte. Como seria se eu morresse... Seria ele pra sempre? E se ele morresse... Seria eu pra sempre?

Eu gosto da minha vida, dos meus parentes, meus amigos, meus afazeres, e ele também gosta dos dele. Mas Faustino me odeia, assim como eu o odeio. Já tentei ir até a casa dele, mas o local onde mora não existe em minha realidade e posso garantir que o local onde vivo não existe na realidade dele.

Agora já tomei dois tipos de remédios pra ficar acordada, estou me acabando nisso, e minha saúde está piorando. Mas preciso me cuidar, pois se morrer corro o perigo de ser um maluco assassino pra sempre.

Mais cedo ou mais tarde ele vai acordar e partir pra sua vida podre, que tanto adora. Já cheguei a desejar a morte de Otto, mas como desejar a morte de alguém tão próximo, de alguém que é você, de alguém que tem tanto direito e vontade de continuar quanto você e eu?

Minha última esperança é que ele mude, ou que eu mude. Mas, meus caros, quem é que muda nesse mundo?

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

AMNÉSIA

Dez anos antes ele fora encontrado nos escombros de um incêndio. Acharam que havia sobrevivido por não estar dentro do prédio, mas sim por perto, na hora em que ruiu. Completamente sem memória... E assim, com a mente em branco, ele reaprendeu a viver. Foi o mais longe possível e agora gerenciava uma floricultura. Após um tempo de trabalho tentando descobrir quem era, ou melhor, quem fora, esse sujeitinho simples e tranqüilo resolveu que não importava mais. Sua vida seguia em frente, tendo ele sido correto ou torto. Sentia às vezes que deveria procurar se informar sobre si, mas passara tanto tempo fazendo-o que pegara um pouco de trauma do assunto. E tem mais: sua vida era boa do jeito que estava. Tinha um emprego razoável, uma namorada a quem amava, e as flores o deixavam tranqüilo. Muitos diziam que ele era um gênio. Conseguia misturar diferentes tipos de plantas e criar as mais belas. Obviamente nunca ninguém conseguiu concluir como aprendera aquilo.
Agora ele caminha pela rua e tem a impressão de que será abordado por ladrões. Ele apressa o passo e entra num prédio, diz boa noite pro porteiro e segue em frente. Mas esses caras não têm noção, seguem-no assim na “caruda”, mesmo? Sobe pelas escadas e ainda ouve esses passos - como de cachorro andando na madeira encerada. Os andares vão passando e o esforço é tremendo - já passa do décimo andar, em puro desespero... Algo como uma luz começa acender no canto superior direito de seu olho direito. Dentro dessa luz, como pétalas numa flor e no centro, como se tivesse uma cena acontecendo. Na cena era ele... Mais jovem, mais forte... Usando uma roupa engraçada. Algo agarra seu tornozelo: era uma mão esverdeada com manchas. Uma mão velha (ou sapos). Ele vira-se assustado; o chapéu da criatura cai, revelando uma cara - que não era bem uma cara, mas ele sabia que era equivalente a uma; sabia porque já soube antes, mesmo com as folhas e tudo. Se ele soube antes, saberia de novo; nunca se sentira tão autoconfiante. Com movimentos que achou ser humanamente impossível e uma caneta que estava no bolso da sua camisa, ele matou (agora que prestava atenção nos cadáveres) cinco criaturas. Sentia-se eufórico, feliz, realizado. Quando havia descido alguns lances de escada, um homem barbado:
- É bom tê-lo de volta, senhor.
- É sempre bom fazer o que se gosta!
Nosso florista abre um zíper no ar e entra.
- Nos vemos mais tarde.

terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Memória e conclusão I

Uma vez um professor na escola me disse que, mais ou menos, de oito em oito anos todos os nossos ossos eram renovados por completo.
Fui ver essa informação e descobri que não são apenas os ossos.
É a pele, os órgãos, o sangue, pelos etc.
Então no período de mais ou menos oito anos, não sobra nada do que eu era oito anos antes.
Eu já fui mais ou menos quatro pessoas diferentes.
Quando olho para fotos (apesar de saber que sou eu e mais ou menos lembrar daquilo tudo), não sou mais eu em nenhum aspecto.

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

SENTIMENTO

Após o incidente, tudo mudara. E era preciso expandir o que sentia. Uma válvula de escape de um lugar desconhecido.
Quando criança, era especial. Do berço até os sete anos de idade não pronunciou uma única palavra. Nem um gugu, nem um dadá. Preocupou muito seus pais que, por mais esforçados que fossem, continuavam sendo humanos. Era como um anjinho, com seus grandes olhos negros. Antena parabólica. Esponja.
Dos oito aos catorze as coisas mudaram. Com a fala veio também a revolta e os sintomas mais óbvios, apesar de não notados, de seu poder. Certa vez seus pais estavam brigando há semanas, sem parar. Com um murro na mesa fez a casa estremecer e todos no mundo se calaram por um minuto. Apesar da energia do ato, a mesa continuou intacta. As brigas entre os pais agora eram direcionadas à própria cria.
Dos quinze aos vinte e um, um tipo de desdém tomou conta, junto a um sentimento de marginalidade. Após juntar muitas coisas não ditas e não feitas, em uma festa chique, de vários talheres e copos, brotou-lhe um grito da garganta com tamanha violência que todos os vidros do local se quebraram, a luz acabou e por semanas todos os presentes - sem ligar o ato ao efeito ou à pessoa - sentiram um enorme vazio no peito, e um silêncio desalentador pairou.
Agora, já com a idade mais avançada, talvez chegando nos vinte e oito, nessa situação difícil de recuperação, notou que o que realmente importava era esse novo sentimento que forçadamente descobrira, um sentimento nostálgico ao contrário, algo de uma pré-infância.
Anterior a isso.
No trabalho, abriu suas mãos em direção aos colegas e eles, olhando com atenção, sentiram-se compreendidos de forma aconchegante.
No trânsito, saiu do carro, ergueu os braços aos céus e assim todos pararam de buzinar, desabotoaram-se e, olhando-se entre si, levantaram as sobrancelhas, querendo achar mais paciência.
Ao chegar em casa, abraçou seus familiares de uma forma que todos entenderam o que se passava e retribuíram ao mundo. Assim, como os colegas de trabalho e as pessoas no trânsito, sentiram toda a paz, silêncio, boa vontade e necessidade de se espreguiçar.
Dirigiu-se ao banheiro, olhou-se no espelho, piscou para si os enormes olhos negros, agora mais negros ainda, e virou luz.

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

NECROTÉRIO

Um dia eu estava no necrotério. Temos esse sistema de proteção ao orgulho e mesmo se um morto levanta na sua frente, hesitamos em assustar e fazer papel de bobo. De qualquer forma, depois dos segundos de hesitação, a lógica tomou conta. Então com calma, o morto olhou pra mim. Ele disse que estava morto, que eu poderia conferir todos os sinais e caso alguém já tivesse falado com um morto, saberia que é bem diferente e não da pra se fingir que se está morto.
- Não sei também o que aconteceu e nem porque, mas deixe de curiosidades. Deixe-me falar, não acredito que vá durar muito esse meu retorno, então ouça minhas conclusões e se puder tirar algo de bom disso, tire. Nada que direi é novidade e o que acontece depois da morte não interessa pra você agora, então, lembre-se... Todas as coisas são assim, elas são o fato e o cheiro do fato. Ficar triste não adianta não resolve, portanto, fique atento e tente descobrir se o que sente é tristeza ou o cheiro da tristeza, porque se for o cheio é só tomar banho que passa. Assim como a alegria, com a diferença de que alegria é gostoso e tristeza não. Mas se você gostar da tristeza... Fique triste! Reclame se tiver que reclamar e não se sinta obrigado a ficar feliz também, não é porque está vivo que você tem obrigação de achar tudo bom! Está cheio de coisas ruins por aqui, não se deixe levar por algo que te incomoda, mesmo se todos disserem o oposto, deveríamos sempre fazer o que nos apetece... Seja justo e elogie o que achar que mereça e, por favor, tente não atrapalhar os outros, todos já têm tantos problemas... No mais, a vida é vazia e sem sentido para os que estão vivos, vendo de onde estou me parece bem óbvio, porém, quando estava morto algo parecia fazer mais sentido, mas você pode imaginar como é a memória de um morto.
Então ele se deitou novamente olhando pro teto e olhou pra mim movendo os olhos, arqueou as sobrancelhas e voltou ao silêncio. Aproximei-me dele lentamente, ele já estava calado como deve estar até hoje. Cobri o morto e saí da sala. A cada dia, seguindo a lógica, aproximo-me mais e mais de onde ele se encontrava na época e parece-me que suas conclusões faziam muito sentido.

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

CHÁ

- Talvez esta história não lhe agrade, mas foi algo que me ocorreu agora quando tomava o chá.
- Talvez o cheiro o tenha feito lembrar.
- É possível. No trem em que estava serviam um chá delicioso. Diferente deste, claro. Mas algo me fez lembrar...
- Deixe de rodeios e conte logo a história!
- Está bem! Estava tomando o trem que vai daqui para São Paulo, quando em meio a toda aquela confusão dos passageiros, apitos, senhoras gordas e baixinhas, homens engravatados com maletas executivas, deu-se aqui neste lugar uma cena que sobressaltou minha visão, assim como uma bela dose. Era um casal. Um casal lindo. Ela, com belíssimos traços - cabelos castanhos, olhos escuros, corpo delicado. Ele, um rapaz deveras bem apessoado, cabelos igualmente escuros. Conversavam na plataforma. Eu via algo de especial neles - havia algo de melancólico... Pausa para mais um gole de chá!
- Sim, e então?
- Então, com o passar dos... Minutos?... Segundos? Não sei bem, sabe, foi algo diferente; começaram a ficar com as feições enérgicas, com a fala alterada. Então percebi que brigavam, provavelmente por um motivo tolo - afinal, eram apenas jovens... Nova pausa para acrescentar um gole no chá!
- E então, acabou?
- Não, a cena foi tão marcante que, mesmo depois do trem partir, fiquei pensando no porquê da briga. Saindo do idílico apaixonado para o nervosismo em tão pouco espaço de tempo; achei interessante.
- E então?
- E então o quê?
- Já acabou a história?
- Já, oras!
- E...?
Cala-se, olha bem para o companheiro narrador, olha para dentro da xícara de chá, dá com os ombros em tom de descaso. Grande gole no chá quente, que o faz lacrimejar. Dá graças a Deus pela medicina de sua época ser uma porcaria. Logo estaria com os vermes, livre de moribundos nostálgicos apreciadores de Eça de Queiroz.

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

TUDO POSSO NAQUELE QUE ME APETECE

Era uma daquelas coisas inéditas que acontecem tantas vezes na vida. Olhar para sua mocinha era o mundo todo desfocado e ele de óculos 3D. Só de conversar com ela brotava uma vontade louca de ter paciência e rever algumas idéias tão antigas como coreto de praça de cidade pequena. Sem falar na aparência. Sabe quando você compra aquele aparelho de som novo que foi desenhado por designers bem pagos pra atingir não qualquer público alvo, mas única e exclusivamente: você? Ou suco de melancia que é uma delicia e não engorda? Ou ir ao dentista e não tem carie nenhuma? Pois é... Era assim que ele se sentia quando encontrava sua amiguinha favorita. E o universo é sem dúvida uma gigantesca empresa que ninguém entende nada e tem tanto procedimento que não sabemos os porquês. Mas como diz aquele livrão de capa escura, foi tudo feito a imagem e semelhança, de onde se conclui que não podemos esperar muito. Tudo que sabemos e conhecemos é menos que a goteira da torneira da casinha do assistente do caseiro júnior. Então é bem pouco provável que qualquer compreensão nossa sirva de alguma coisa além de nós mesmos. Uma coisa que deixava nosso amigo feliz da vida era estar perto da sua amiguinha. Fisicamente ou na memória de um dos dois. E isso já era tão bom demais da conta que se precisasse, até entenderia o conjunto das coisas todas. Inclusive o fato de que tudo tende a passar como soluços e coceiras na sola do pé quando estamos de bota.

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

VINI VIDI VICI

Eu sou invencível, portanto, faço o que quero. Não tenho família e por ser imortal, acabei me distanciando de todas as pessoas. Não podem me forçar a nada usando métodos legais, pois a lei não se aplica a mim. Ou melhor, se aplica... Mas quem a fará vigente? Podem tirar minha fortuna e me deixar sem teto e sem comida e certamente não terão me parado ainda. Podem atirar em mim, me queimar, cortar minha cabeça, enfiar uma estaca no meu coração, me enterrar numa pedreira de kriptonita, me fatiar em pedacinhos e mandar cada pedaço pra um canto do mundo. Nunca vão chegar nem perto de conseguirem tais feitos, mas se conseguirem, não vão me matar ou machucar, só vão me atrasar. Mas não me tome por uma pessoa má, quero o bem e é por isso que fico. Faço minhas coisas, sou um livro aberto, não é segredo. Não é minha identidade secreta, eu sou invencível. Podem entrar na minha casa quando estiver dormindo, mas o que possivelmente alguém conseguiria com isso? Por ser eu quem sou, nada me detém e apesar de não ser especialmente forte ou saber lutar qualquer luta, não vou parar até que, se preciso for, fizer o oponente parar. Venho desde sempre e seguirei pra além das previsões. Sou irreverente, irreproduzível, irreparável, invencível, intocável, inquestionável, inquebrantável, inimputável, indescritível, incorruptível, incontestável e indestrutível, mas nunca, nunca impune.

sábado, 4 de dezembro de 2010

ENCONTRO

Bom, a história é a seguinte: todos na grande casa morrem, um por um. Claro que eu, Teotônio, sobrevivo. Ao descobrir que todos estão mortos, encontrei senhor Lázaro no jardim dos fundos. Ele me pediu algo que achei muito estranho na hora e continuo achando até agora. Algo que envolvia o ato de um homem cavando buracos e colocando coisas dentro deles. Sim, meus amigos, enterrei todos os corpos. A única razão para estar naquele encontro era que, na verdade, gostava de escrever e de ser chamado de poeta, mas minha verdadeira profissão, a que pagava o pouco que podia das minhas dívidas, era a de coveiro. E finalmente tive minha utilidade naquela noite. Devo alegrá-los ao contar que tudo que era de Lázaro agora é meu. Era pouco o que não haviam roubado, mas só a casa já me deu muito mais de um milhão, sem contar os móveis sobre os quais achei o documento que alegava que tudo aquilo era por direito meu. O “mordomo” me entregou o papel e sumiu no ar. Era o cartão de um advogado que resolveu o resto e que logo em seguida morreu de câncer - segundo os médicos, devido ao seu nojento hábito de fumar. Pensei em escrever um livro contando minha história, mas, pensando melhor, ninguém ia ler mesmo. Livraria é cemitério de livros, e de cemitérios já tive minha porção...